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Bolsonaristas usam símbolos internacionais de extrema direita

O uso de um símbolo ucraniano milenar em manifestação pró-Bolsonaro em São Paulo, no último domingo, 31, chamou atenção para as referências que influenciam os grupos que dão apoio ao governo. A bandeira motivou um esclarecimento do embaixador da Ucrânia no Brasil, uma nota de repúdio de descendentes de ucranianos no País, e preocupação entre especialistas que acompanham a “tropicalização” de símbolos associados à extrema direita no mundo – das tochas e máscaras em frente ao Supremo Tribunal Federal às Cruzadas da Idade Média.

Vermelha e negra, a bandeira ucraniana que causou a confusão na Avenida Paulista tem um tridente estilizado em branco. É um símbolo nacional adotado oficialmente na Ucrânia desde a independência, em 1991, quando se separou da União Soviética. Integrantes de torcidas organizadas antifascistas acusaram o símbolo como referência neonazista, o que foi rechaçado pelo dono da bandeira.

Brasileiro radicado na Ucrânia há seis anos, o técnico em segurança Alex Silva lembra que o tridente era o símbolo do príncipe Vladimir, que levou o cristianismo à Ucrânia no século 10. Ele conta que o avô de sua esposa, que é ucraniano, teve o irmão morto por nazistas na Segunda Guerra Mundial. “Aquilo não tem nada a ver com símbolo nazista”, disse Silva ao Estadão. “É uma ofensa enorme, você não tem ideia de como isso me ofende pessoalmente e ofende a honra da minha esposa.” Ele chama atenção para o significado das cores: o preto é uma referência à terra, e “o vermelho representa o sangue dos heróis ucranianos que foi derramado por gerações, por séculos”.

O tridente e as cores são usados também pelo grupo paramilitar Pravyi Sektor (Setor Direito), de extrema direita, que se tornou partido político após a queda do presidente ucraniano Viktor Yanukovich. As cenas de batalha campal em Kiev, que levaram à queda do presidente, têm inspirado bolsonaristas no Brasil. No Twitter, o deputado federal Daniel Silveira (PSL-RJ) escreveu que “está na hora de ucranizar o Brasil”, bordão que já era repetido pela ativista bolsonarista Sara Winter.

“Isso significa ucranizar o Brasil: jogar o político sujo na lata de lixo, como fez o povo ucraniano, de uma maneira honrosa”, diz Silva. A imagem remete à foto de um deputado ucraniano, que defendia Yanukovich e sua política pró-Rússia, atirado no lixo em uma manifestação em 2014.

Descendentes de ucranianos em Curitiba, onde há a maior comunidade no País, divulgaram uma nota de repúdio contra o uso da bandeira. “Temos ciência da existência absolutamente minoritária de movimentos extremistas na Ucrânia, que se apropriaram indevidamente dos símbolos nacionais para disseminar ideais fascistas e neonazistas”, diz a nota do Grupo Folclórico Ucraniano Poltava.

Para especialistas, o uso das cores é considerado preocupante, mais do que sua origem no século 10. “A bandeira não é nazista mas, como se diz, é uma apropriação simbólica”, diz o professor David Magalhães, da Pontifícia Universidade Católica (PUC-SP), que dá aulas de Relações Internacionais e coordena o Observatório da Extrema Direita, que reúne pesquisadores de outras universidades. “Essa relação do sangue e a terra é muito forte no movimento ultranacionalista. Isso não apaga nada do fato”, diz. O professor chama atenção para uma inconsistência no discurso anticorrupção no Brasil, associado ao deputado na lata de lixo. “Bolsonaro está se aproximando da faceta mais podre do sistema, que é o Centrão. Eles realmente ignoram essa faceta.”

Já o pesquisador Gustavo Menezes, especialista em relações internacionais na região da ex-URSS, diz que muitos símbolos associados à extrema direita foram apropriados pelo novo governo da Ucrânia.

“Há uma espécie de tentativa oficial de apresentar o movimento como positivo, é por isso que vão tentar normalizar o uso daquelas cores”, diz. “Certamente é algo que torna a Ucrânia atraente para os bolsonaristas, porque parte dessas políticas oficiais são exatamente uma tentativa de colocar o nazismo e o comunismo como males de igual teor.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Por Tulio Kruse

Estadão Conteúdo

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