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Sobre veto a Ramagem, criminalistas lembram quando Gilmar barrou Lula

A decisão do ministro Alexandre de Moraes de suspender a nomeação de Alexandre Ramagem à diretoria-geral da Polícia Federal segue precedente aberto pela Corte de quando o ministro Gilmar Mendes suspendeu a nomeação do ex-presidente Lula como ministro de Dilma Rousseff, avaliam advogados consultados pelo jornal O Estado de S. Paulo. Criminalistas destacam que os atos administrativos devem mirar exclusivamente o interesse público sendo que, em caso de desvio de finalidade, a nomeação pode ser barrada pelo Judiciário com base no artigo 37 da Constituição Federal, inclusive com a suspensão liminar da nomeação enquanto o assunto é avaliado no mérito.

A indicação é feita inclusive por Flávio Henrique Costa Pereira, sócio coordenador do Departamento de Direito Eleitoral e Político do BNZ Advogados, que foi um dos autores do pedido de impeachment de Dilma e também um dos responsáveis pelo mandado de segurança impetrado contra a nomeação de Lula.

“Naquela oportunidade, em mandado de segurança coletivo que promovemos pelo PSDB, foi reconhecido, assim como agora, o desvio de finalidade do ato de nomeação. A decisão é um importante marco para a fixação de limites no exercício do Poder Executivo, além de estabelecer balizas da separação de poderes”, afirma.

Tony Chalita, mestre em Direito Constitucional, especialista em Direito Eleitoral e também sócio coordenador do Departamento de Direito Eleitoral e Político do BNZ Advogados, também indica que a decisão de Alexandre está alinhada ao precedente do próprio STF.

“O presente caso não é diferente. De fato, a nomeação do diretor geral é realmente de competência do presidente da República. Todavia, as circunstâncias e as revelações que permearam esta escolha , a despeito de estarem, à primeira vista, em conformidade com uma regra, destoam da razão que a justifica, escapando ao princípio e ao interesse público que lhe é subjacente. Este fundamento, inclusive, foi reafirmado na decisão do ministro Alexandre de Moraes”, explica.

Conrado Gontijo, criminalista, doutor em Direito Penal e Econômico pela USP, diz ainda que “é fato que as acusações feitas pelo ex-ministro da Justiça são gravíssimas, pois não se pode aceitar que o presidente interfira em investigações criminais, e, para evitar que essa interferência possa eventualmente ocorrer, o STF impôs a suspensão da nomeação”. Ao anunciar sua saída do governo Bolsonaro, o ex-ministro Sérgio Moro acusou o presidente de tentar interferir politicamente no comando da Polícia Federal para obter acesso a informações sigilosas e relatórios de inteligência.

Segundo o criminalista André Damiani, sócio-fundador do Damiani Sociedade de Advogados, “todo e qualquer ato administrativo, inclusive a nomeação do diretor-geral da Polícia Federal, deve mirar exclusivamente o interesse público”. Ele lembra que, em caso de “desvio dessa finalidade”, a nomeação é barrada pelo Judiciário, com base no art. 37, da Constituição Federal.

O especialista em Direito Constitucional do Peixoto & Cury Advogados Saulo Stefanone Alle também ressalta que o poder discricionário do presidente da República não é absoluto porque ele está sujeito, em sua atuação, aos princípios constitucionais. “Cabe ao Poder Judiciário avaliar com cuidado se há o alegado desvio de finalidade, sendo tecnicamente possível a suspensão liminar da nomeação enquanto o assunto é avaliado no mérito”, afirma.

Márcio Casado, sócio do Márcio Casado & Advogados, faz uma ressalva, diferenciando o episódio do caso Lula do atual. “É tudo diferente no cenário atual. A Casa Civil é cargo político. A Chefia da Polícia Federal é órgão de Estado. O que significa uma decisão desse tamanho? O reconhecimento de que a Presidência da República deseja intervir indevidamente no trabalho da Polícia Federal. E daí? O impeachment está cada dia mais próximo”, analisa.

O criminalista Daniel Gerber entende, no entanto, que as decisões do STF sobre atos administrativos discricionários, de competência da Presidência da República, parecem “intromissões indevidas na esfera de independência do Poder Executivo”.”Mas não há nada que ocorra em tais instituições que seja fruto do mero acaso ou descuido institucional de algum ministro. Pelo contrário, salta aos olhos que o Supremo deseja, busca e está a alimentar verdadeiro confronto institucional”, diz.

Na avaliação de Gerber, Ramagem preenche os critérios objetivos do cargo para o qual foi nomeado e o argumento de “fumaça do bom direito” quanto ao princípio da impessoalidade “é baseado, por óbvio, em ilações de partidos políticos adversários, para justamente subjetivar e, consequentemente, pessoalizar a escolha da ‘pessoa certa’ para o cargo, ainda que pelo viés inverso de impedir que a ‘pessoa errada’ seja a escolhida”.

“Infelizmente, e como registra a história, em atritos institucionais de tal porte, quem sempre paga a conta é o cidadão comum, seja por exclusão de presidentes, seja por exclusão de garantias jurídicas e constitucionais”, diz ainda o criminalista.

Por Pepita Ortega e Fausto Macedo

Estadão Conteúdo

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