Press "Enter" to skip to content

Boeing desiste da joint-venture com a Embraer (atualizado)

(Foto: Divulgação / Embraer)

(atualizado com comunicado da Embraer e comentários de especialista no setor)

A empresa aeronáutica americana Boeing anunciou, na manhã deste sábado (25), o cancelamento das negociações para a formação de uma joint-venture com a brasileira Embraer (EMBR3). Segundo um comunicado da Boeing, pelos termos do acordo, “24 de abril de 2020, era a data inicial de rescisão, sujeita a prorrogação por qualquer das partes, se determinadas condições fossem atendidas. A Boeing exerceu seu direito de rescisão depois que a Embraer não satisfez as condições necessárias.” A Boeing não informou quais condições não foram satisfeitas pela Embraer.

No comunicado, Marc Allen, presidente da Embraer Partnership & Group Operations, definiu o cancelamento como “profundamente decepcionante”, mas afirmou que “chegamos a um ponto em que a negociação continuada no âmbito do MTA não resolverá os problemas pendentes”.

NEGOCIAÇÕES

O acordo vinha sendo costurado desde 2017, devido a mudanças no cenário mundial. O mercado de aviões de médio porte e de aeronaves dedicadas à aviação executiva é dominado por duas empresas, a Embraer e a canadense Bombardier. Naquele ano, a companhia do Canadá associou-se à francesa Airbus, principal concorrente da Boeing. A lógica do negócio era clara: associar o conhecimento de engenharia para a construção de aviões de médio porte da Bombardier à musculatura financeira e comercial da Airbus. Isso deixaria tanto a Boeing quanto a Embraer em desvantagem, o que levou a empresa americana a telefonar para São José dos Campos, sede da empresa brasileira.

Criada nos anos 1970 e privatizada em 1994, a Embraer sempre foi considerada uma empresa estratégica para o Brasil. Além da aviação comercial, produzindo aviões de médio porte, a Embraer também atua na aviação executiva (aeronaves menores) e na sensível área da defesa, com uma atuação expressiva na aviação militar. Tanto que, após a venda para o setor privado, o governo federal manteve uma “golden share”, uma ação com poderes especiais, que lhe permitiria impedir a venda da empresa para companhias estrangeiras.

Quando começaram as tratativas com a Boeing, ainda durante o governo de Michel Temer, a questão quase emperrou devido à área militar. A solução encontrada foi vender a área de aviação comercial, mantendo boa parte da aviação executiva e todas as atividades militares no que se convencionou chamar de Embraer remanescente, algo que representava cerca de 20% dos negócios da companhia.

CRISE DO SETOR

Além das dificuldades para desvincular essas áreas da Embraer, a Boeing também tem seus problemas. A epidemia do coronavírus derrubou a demanda por viagens, o que fez as empresas aéreas reduzir suas encomendas. Além disso, a Boeing vem sofrendo com os acidentes sofridos pelo modelo 737 MAX, modelo mais eficiente em termos de combustível que é a principal aposta tecnológica da companhia. Problemas técnicos na aeronave geraram acidentes fatais, afetando ainda mais os resultados da Boeing.

Com isso, a companhia americana vem tendo dificuldades em operar, o que afetou suas finanças.

Não por acaso, suas ações desabaram. Os papéis da Boeing custavam 325,76 dólares no fim de 2019, para cair a 128,98 dólares na sexta-feira (24), uma queda de 60,4 por cento. Nesse período, a queda das ações da Embraer foi semelhante. No fim de 2019, os papéis eram cotados a 19,73 reais, e amargaram uma queda de 58 por cento no acumulado do ano, tendo fechado a 8,28 reais na sexta-feira.

COMUNICADO DA EMBRAER

Em um comunicado enviado ao Mercado News, a Embraer (EMBR3) afirmou que a Boeing “rescindiu indevidamente” o acordo de fusão e “fabricou falsas alegações como pretexto para tentar evitar seus compromissos”. Pelo acordo, informou a Embraer, a Boeing deveria pagar 4,2 bilhões de dólares à empresa brasileira pela participação em seus negócios.

A empresa afirmou que “buscará todas as medidas cabíveis contra a Boeing pelos danos sofridos como resultado do cancelamento indevido e da violação do acordo.” No comunicado, a Embraer afirma acreditar que “a Boeing adotou um padrão sistemático de atraso e violações repetidas ao MTA, devido à falta de vontade em concluir a transação, sua condição financeira, ao 737 MAX e outros problemas comerciais e de reputação”.

A Embraer acrescentou ainda que “nossa história de mais de 50 anos está alinhada com muitas vitórias, mas também com alguns momentos difíceis. Todos eles foram superados. E é exatamente isso que vamos fazer novamente.”

AVALIAÇÃO

Segundo Guto Ferreira, especialista no setor industrial e sócio diretor da Solomon’s Brain Inteligência Crítica, a desistência do acordo por parte da Boeing vai além das tratativas entre as duas empresas. É fato que tanto a Boeing quanto o setor de aviação de maneira geral estão enfrentando uma crise violenta devido à pandemia do coronavírus. O número de viagens caiu drasticamente e a produção de aeronaves parou. “A companhia deve estar negociando um pacote de apoio com o governo dos Estados Unidos, mas isso torna inviável desembolsar 4,2 bilhões de dólares para comprar a Embraer””, diz ele.

Nesse cenário, Ferreira avalia que a Embraer deve ficar em uma situação difícil. Seus principais concorrentes são a Bombardier e a empresa chinesa Commercial Aircraft Corporation of China, conhecida por Comac, que está entrando nesse mercado.

A Embraer não tem para quem vender aeronaves neste momento, e será preciso ver qual será a posição do governo brasileiro, diz o especialista. “A Embraer pode continuar vendendo aeronaves menores para o mercado regional, como vem fazendo”, afirma. “Como os Estados Unidos devem manter sua disputa comercial com a China, eles não vão apoiar as vendas dos jatos chineses. Mas eles podem apoiar tanto a Bombardier quanto a Embraer, o que torna o cenário incerto para a empresa brasileira”, diz.

Be First to Comment

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *