Pelo menos 70% dos brasileiros precisam estar imunizados para que possamos começar a falar em fim da epidemia de covid-19 no País. Chegar a esse porcentual só será possível depois que a maioria da população tiver sido infectada e curada. A alternativa é ter uma vacina, que dificilmente chegará ao mercado antes do fim do ano.
Prever como ou quando atingiremos esse patamar é um exercício de futurologia. Não há precedentes na história recente da humanidade para a crise atual. Por isso, não se pode mirar eventos passados em busca de respostas. Alguns estudos, porém, tentam olhar para o futuro e apontar caminhos possíveis.
Uma unanimidade entre especialistas é a adoção do distanciamento social de forma prolongada para retardar o aumento de casos. “Não há ainda meios de avaliar se as medidas que estão sendo implementadas surtirão os efeitos necessários”, afirma o especialista em modelagem epidemiológica da Universidade Estadual Paulista (Unesp) Roberto Kraenkel. “Mas projeções feitas para outros países indicam a necessidade de lockdown (isolamento total das cidades, com manutenção apenas de serviços essenciais) por, ao menos, dois meses.”
Estimativas feitas por especialistas da Pontifícia Universidade Católica do Rio (PUC-Rio) e da Fiocruz apontam que, até amanhã, o País deve registrar 6.375 casos – número que pode variar entre 3.555 (cenário otimista) e 11.548 (cenário pessimista). A expectativa é de que, na próxima semana, o total de casos comece a aumentar exponencialmente até que os efeitos das medidas de distanciamento social comecem a ser sentidos.
Caso medidas mais drásticas não sejam cumpridas – ou sejam suspensas, como sugeriu o presidente Jair Bolsonaro -, a epidemia no Brasil pode seguir o mesmo caminho trilhado pela infecção na Itália e na Espanha, que já somam 14,2 mil mortes. Nesses países, o número de casos cresceu mais rápido do que a capacidade do sistema de saúde de absorver pacientes.
A ideia de reduzir o impacto econômico das estratégias de mitigação e isolar só os mais vulneráveis (idosos e doentes crônicos, por exemplo), como propôs Bolsonaro, foi aventada por outros líderes mundiais. A própria Itália contemplou a estratégia no início da epidemia. Rapidamente, diante da explosão de casos e mortes, mudou de ideia. O primeiro-ministro do Reino Unido, Boris Johnson, também. O que fez o líder britânico recuar foi um estudo do Imperial College de Londres, de 16 de março. O trabalho projetou 250 mil mortes no país, se apenas medidas de isolamento mais brandas fossem adotadas.
Para o Brasil, os pesquisadores do Imperial College, liderados por Neil Fergunson, indicam que uma estratégia de isolamento social de manter só idosos em casa poderia levar à morte mais de 529 mil pessoas. O número é metade do que se projeta para um cenário em que nada fosse feito para conter o coronavírus (1,15 milhão de óbitos). Mas é bem mais alto do que a estimativa para um isolamento social rápido e amplo. Mesmo com essa restrição drástica, haveria ao menos 44 mil mortes.
“Se medidas de isolamento e contenção propostas pelos Estados forem respeitadas, podemos considerar um crescimento similar ao da França (o país confirmou o 1.º caso em janeiro. Hoje, tem 33,54 mil pacientes e 1,9 mil mortes)”, afirmou Silvio Hamacher, da PUC-RJ, integrante do Núcleo de Operações e Inteligência em Saúde (Nois).
Segundo pesquisadores do Imperial College, para surtir efeito sustentável, a estratégia teria de continuar por muitos meses. Idealmente, até o desenvolvimento da vacina ou a chamada imunização de rebanho, quando a maioria da população já foi contaminada. Pelos cálculos do grupo, até seria possível suspender o isolamento de tempos em tempos, mas muito brevemente, para não abrir caminho para novos surtos.
China. Com a pandemia ainda em curso, quem já passou pela fase aguda traz mais ensinamentos. Após cerca de três meses do início oficial da epidemia, só agora a China começa a reabrir a província de Hubei, onde fica Wuhan, mas a cidade que é epicentro do novo coronavírus ainda deve ficar fechada por mais duas semanas.
O biólogo Fernando Reinach, colunista do Estado, afirma que acompanhar os desdobramentos da reabertura de Wuhan será fundamental para entender como a epidemia vai se comportar. Para ele, por enquanto, o único caminho que parece seguro para evitar muitas mortes é mesmo conter a população. O outro caminho, diz, seria fazer como a Coreia do Sul, que está testando em massa a população e agindo rapidamente para conter quando há infectados e rastrear seus contatos, a fim de evitar a dispersão.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
Por Giovana Girardi e Roberta Jansen
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