Depois de passar pelo PT e pela Rede, Alê Youssef foi nomeado secretário municipal de Cultura do tucano Bruno Covas no fim de 2018. Muita gente no PSDB torceu o nariz. Mas a Virada Cultural, o Carnaval de Rua e o Festival Verão Sem Censura se tornaram marcas da gestão Covas, ajudaram a diferenciá-lo do bolsonarismo e aproximaram o prefeito do eleitorado de esquerda.
Em entrevista ao Jornal O Estado de São Paulo, o secretário disse que o centro político é composto de elementos da direita e da esquerda e que pretende se dedicar à criação de um movimento cívico para debater a importância das políticas culturais. Na opinião dele, é importante que a maior cidade do Brasil se posicione em defesa da democracia e Regina Duarte, nova secretária de Cultura, está sendo usada pelo governo Jair Bolsonaro.
Qual sua avaliação sobre Regina Duarte ter aceito ser secretária de Cultura do Bolsonaro?
Regina Duarte só desenvolverá um trabalho relevante na Cultura se conseguir romper com três situações recorrentes neste governo: a criminalização do artista e da arte, o flerte com o obscurantismo e a censura. Não dá para o governo gerar a censura que está gerando contra peças, filmes e produções culturais que não dialogam com sua ideologia. Não havendo a possibilidade de fazer isso, está na cara que a Regina Duarte está sendo usada pelo governo Bolsonaro para tentar fazer algum tipo de média que é impossível de se fazer com o setor artístico.
O ataque a produções culturais levou a cultura para o centro do debate político?
O ataque à cultura gera uma janela de oportunidade para a arte se levantar e se contrapor a este ambiente. A balela do marxismo cultural é só mais uma fake news inventada no processo eleitoral. Eles misturam tudo e criam um Frankenstein político baseado neste fenômeno do “liberal na economia e conservador nos costumes” só para gerar confusão. O problema é que eles estão levando a tática eleitoral para a gestão. Aí a gente tem o (Roberto) Alvim (ex-secretário especial de Cultura) descendo o pau na Fernanda Montenegro, os casos de censura no CCBB e na Funarte por causa de peças de temática LGBT, a crítica do Bolsonaro à produção cinematográfica e coisas mais concretas como os cortes nas autarquias federais e a mudança de teto na lei de incentivo sem diálogo com o setor.
A reação do setor tem dado resultados positivos?
Se isso tiver um lado positivo é o de criar uma mesma frequência de atuação em todo o setor. Chamo de setor cultural os artistas, mas também os produtores e empreendedores, as instituições culturais como Sesc que têm que estar na mesma dinâmica de defesa da cultura. Eu como gestor cultural público considero importante São Paulo, a maior cidade do País, a grande capital da diversidade cultural, estar posicionada neste mesmo local. Outros gestores públicos têm que se posicionar neste momento.
Se a cultura ajuda a posicionar a cidade de São Paulo ela também pode ajudar a reposicionar o prefeito Bruno Covas no espectro político/eleitoral? Ele foi eleito vice de João Doria (PSDB) com um discurso de direita.
Não sei fazer essa avaliação eleitoral, mas o prefeito tem dito que quer fazer a valorização do centro democrático. Entendo que centro tem que ter tanto a direita quanto a esquerda. Não existe centro sem esquerda. Se eu cumpro esse papel fico muito feliz porque sinto a necessidade também de a gente buscar o centro democrático. A gente tem que fugir das radicalizações polarizadas que nos levaram a essa situação, de um governo totalmente descompromissado com valores democráticos.
Como vai ser na campanha eleitoral se o prefeito decidir adotar uma linha de antipetismo?
Não sei como vai ser a campanha. Mesmo estando em ano eleitoral, acho precipitado fazer qualquer diagnóstico agora. O que eu sei é que vou apoiá-lo e trabalhar bastante para que Bruno Covas seja reeleito porque ele está fazendo na cultura e em outras áreas uma gestão transformadora. Eu sou uma pessoa “covista”.
Por que você entrou e por que saiu do PT?
Entrei no PT quando era adolescente numa época em que muitos adolescentes entravam no PT. E saí na época do mensalão porque me decepcionei profundamente com o partido.
Pretende se filiar a algum outro partido e disputar eleições?
Não tem nenhuma pretensão de filiação nem de eleição no meu horizonte. Meu horizonte está entre três aspectos. Um é o apoio ao prefeito Bruno na sua reeleição. O segundo é a construção de linhas de continuidade e institucionalização do programa São Paulo Capital da Cultura. E o terceiro é a construção de um movimento cívico em torno da centralidade da cultura como elemento de desenvolvimento econômico e social das cidades, dos Estados e do País. A gente tem que romper com a ideia de que a cultura é um departamento separado.
Qual seria o formato deste movimento?
Um movimento nos moldes do RenovaBR, Acredito, só que voltado para a centralidade da cultura. Seria para dialogar e levar para outros movimentos a importância da cultura.
E os partidos?
Os partidos também. Uma coisa não exclui a outra. A sociedade civil precisa se empoderar da política, ocupar partidos, seja através de movimentos ou não. Isso não é antagônico. A gente está vivendo uma mania de antagonizar tudo.
E qual a sua avaliação sobre o governador João Doria?
Sou covista e por isso acredito muito na forma como o prefeito faz as coisas. Em relação ao governador não cabe a mim avaliar. Fui convidado pelo prefeito e trabalho para ele. Tenho ótima relação institucional com o governador.
Quando querem criticar o Bruno à direita citam você como uma espécie de lado à esquerda do governo. Como você vai tratar isso na campanha?
A campanha tem que ser tratada em cima de plano de governo. Quais são as propostas que estão colocadas e vão representar este lado mais à esquerda ou mais progressista? Eu, como gestor cultural, vou trabalhar para que as políticas públicas de cultura, de ocupação do espaço público, de direitos humanos, relacionadas à cidadania, inclusão e habitação sejam voltadas para o interesse da população mais pobre ou para o interesse da diversidade.
O carnaval tem que ter limites?
Ataque ao carnaval é ataque à identidade nacional. Assim como ataque aos índios e contra as comunidades quilombolas, como não colocar a bandeira a meio pau quando o João Gilberto, um dos maiores nomes da nossa cultura, morreu, assim como atacar a Fernanda Montenegro. O carnaval é a maior festa da expressão popular do Brasil, a nossa grande expressão cultural e obviamente o carnaval é o território da liberdade.
O que você achou da patrulha em relação a determinadas fantasias, a Alessandra Negrini?
Foi uma patrulha absolutamente desnecessária. Mostra que a gente está numa situação muito radicalizada no País. Lembro que junto com a Alessandra uma outra instituição basilar do nosso carnaval também foi patrulhada, que é o Cacique de Ramos. A gente precisa realmente de um rearranjo nacional em busca da união e dos nossos ícones identitários como amálgama dessa união. A resposta da Alessandra foi educativa quando ela disse que nós precisamos, sim, nos apropriar dos elementos relacionados à luta indígena porque eles precisam do nosso apoio.
Surpreende essa patrulha ter vindo da esquerda?
Não surpreende nada. A esquerda exerce patrulhas e cai nos jogos de polarização de uma maneira terrível. A polarização é ruim pela ação da direita e também da esquerda. Para que serve essa polarização? Quem são os atores que se beneficiam?
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
Por Ricardo Galhardo e Pedro Venceslau
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