Com o veto às coligações proporcionais, partidos políticos têm feito uma corrida interna para ampliar o número de mulheres dispostas a se lançar em campanha. Como a nova regra obriga que a partir deste ano cada legenda tenha, de forma independente, ao menos 30% de nomes femininos nas urnas, partidos que não alcançarem esse porcentual vão ter de barrar homens na eleição.
A conta é simples. No caso da disputa para a Câmara Municipal de São Paulo, o partido que quiser apresentar uma chapa de vereadores “cheia” terá 82 candidatos (150% do total de 55 vagas). Desses, 25 deverão obrigatoriamente ser mulheres. Mas, se a cota feminina não for atingida, a lista de homens terá de ser reduzida na mesma medida e a chapa será então proporcional.
Em eleições anteriores, quando a cota de gênero já estava valendo, mas o veto às coligações ainda não, os partidos se coligavam e valia a média de candidaturas femininas do bloco. Na prática, uma legenda podia salvar a outra. Agora, é cada uma por si.
Além de estabelecer uma porcentagem mínima de candidaturas de mulheres, as regras eleitorais determinam que os partidos destinem ao menos 30% de sua verba do Fundo Eleitoral para as campanhas femininas. As eleições de 2018 foram as primeiras em que esta porcentagem foi obrigatória, e, no fim de 2019, o desvio de recursos públicos para campanhas eleitorais, usando principalmente candidaturas “laranjas”, já tinha rendido 221 inquéritos à Polícia Federal.
Investigado em Minas e Pernambuco por candidaturas laranjas em 2018, o PSL tem realizado encontros para incentivar a filiação de mulheres. Questionado sobre se alguma medida foi tomada para evitar que candidaturas femininas sejam apenas figurativas, o partido não informou nada específico. “Os processos de auditoria e controle são os mesmos para todas as candidaturas, sejam homens ou mulheres”, escreveu a assessoria.
Segundo o advogado e professor de Direito Eleitoral do Mackenzie Alberto Rollo, além de candidaturas laranjas para desvio de dinheiro, as eleições de 2020 devem contar com as “laranjas para acomodar homens”. “Se de cada 10 candidatos, 7 são homens e 3 são mulheres, necessariamente, nas cidades maiores, para acomodar os homens que querem ser candidatos, os partidos precisam literalmente inventar candidatas mulheres.”
Mapa
Para lançar suas “próprias candidatas”, os partidos têm investido em mapear e capacitar mulheres pelo país. Em geral, são promovidos alguns encontros em que as possíveis candidatas aprendem sobre temas como legislação eleitoral e comunicação digital, além de serem incentivadas a participar do pleito.
O caráter municipal da eleição é um desafio extra. “Nas eleições de 2018, trabalhamos num universo menor. Agora, vamos ter que chegar lá na ponta, trabalhar nos mais de 5 mil municípios do o Brasil”, diz a presidente do PT Gleisi Hoffmann. O partido quer expandir o projeto de candidaturas femininas. Intitulado “Elas por Elas”, a iniciativa proporciona formação, orientação e acompanhamento jurídico de candidatas. Segundo Gleisi, no entanto, o PT não destinará mais do que os 30% estipulados pela legislação como piso de financiamento para candidaturas de cada gênero. “Infelizmente, pela cultura do mundo masculino da política, temos muito mais candidatos homens. Não temos condição de colocar mais (que os 30%) à disposição das mulheres.”
Na mesma linha, o PSDB quer reforçar a estratégia feminina e lançará plataforma digital com curso de formação política para candidatas. Segundo a presidente do PSDB Mulher, Yeda Crusius, a meta é lançar mais de dez mil mulheres. Para isso, afirma que a capacitação deve ser mais “eficiente”. “É fazer como em 2018, mas melhor, com menos custos. Tivemos 330 candidatas financiadas por nós (em 2018) e agora vamos ter dez mil candidatas. Então, não pode ser o mesmo caminho de antes”.
Diversos outros partidos, como PL, PSD, Cidadania e PTB também têm adotado medidas para estimular a filiação e a candidatura de mulheres. Com a presidência de Graciela Nienov, por exemplo, o PTB Mulher lançou o projeto Vez, Voz, Voto, que busca qualificar mulheres para serem candidatas. Segundo Graciela, as cotas de gênero foram fundamentais para que os partidos abrissem espaço às mulheres.
Em relação à porcentagem mínima de financiamento de mulheres, a deputada federal Tabata Amaral (PDT-SP), que encabeça o projeto suprapartidário de potencialização de candidaturas femininas em 2020 Vamos Juntas, ressalta que é importante prestar atenção à possível explosão de candidaturas femininas como vice para cumprir a cota.
Eleitas
Em 2018, apenas 15% das cadeiras do legislativo federal foram preenchidas por mulheres. Segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), além disso, só homens foram eleitos para Câmaras Municipais de quase 1,3 mil cidades brasileiras em 2016. Isso significa que, em 23% das Câmaras do País, não há vereadoras.
A cota de gênero garante as candidaturas, mas não a eleição das mulheres. Segundo pesquisa do coletivo Vote Nelas, que defende mais mulheres na política, como o recrutamento de candidatas não precisa se refletir em cadeiras, ele pode “dar uma falsa impressão de que o partido quer mulheres em seus quadros”. Apoiadora do coletivo, a pré-candidata a prefeita de Goiânia Dra. Cristina (PSDB) coloca a defesa das mulheres como uma de suas principais pautas. “Fiz vinte anos no hospital”, conta ela, que foi vítima de violência doméstica e teve 85% do corpo queimado. “Meu ex-namorado tentou me matar com álcool e fogo. Eu tinha me formado em educação física e ia morar fora do Brasil. Ele não aceitou.”
Na política, Cristina reclama que os partidos não destinam cargos majoritários a mulheres. Para se lançar prefeita, ela mudará para o PL – hoje está no segundo mandato como vereadora pelo PSDB e já foi da Executiva Nacional tucana. Com a presidência de Soraya Santos, o PL Mulher também está fazendo cursos de formação de mulheres pelo País. “Nós começamos desde 2019 a fazer movimentos em Estados. Estamos fomentando, principalmente no interior, as candidaturas (femininas).” Para ela, o que une a bancada feminina é a pauta dos direitos humanos. “Se você pensar da Ceci Cunha à Marielle, não me lembro de político homem ser assassinado, por exemplo, por defender ideias. Isso é uma questão da forma que a mulher age quando quer defender uma causa.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
Por Adriana Ferraz e Fernanda Boldrin
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