O corpo de Adriano Magalhães da Nóbrega repousa em uma geladeira do Instituto Médico Legal (IML) do Rio oito dias após a morte do ex-capitão da Polícia Militar, apontado como chefe da milícia Escritório do Crime. O atraso no sepultamento deve-se a uma disputa familiar e a investigações sobre as ligações de Nóbrega com o crime organizado no Rio e com o esquema de rachadinha (devolução de parte do salários) no gabinete do então deputado estadual Flávio Bolsonaro, hoje senador sem partido.
Nóbrega estava com prisão decretada no Rio, de onde fugira em janeiro de 2019, por causa de investigações sobre a milícia. Sua ex-mulher, Danielle Mendonça, e sua mãe, Raimunda Veras Magalhães, foram contratadas como assessoras de Flávio e são investigadas por causa da “rachadinha”. Há indícios de que Nóbrega se beneficiava do esquema. Ele foi morto no domingo retrasado, 9 de fevereiro, em uma operação policial em Esplanada, no interior da Bahia, Estado onde estava foragido.
De acordo com a polícia, o ex-capitão recebeu os agentes a tiros. Por isso, foi morto em confronto.
A necropsia feita em Salvador confirmou a versão oficial, embora ainda estejam pendentes laudos importantes para a investigação da morte. Faltam o resultado do exame residuográfico (que informaria se Nóbrega disparou uma arma de fogo) e o das marcas de bala nos escudos policiais (que indicariam a reação). Também ainda não ficou pronta a perícia do local da morte.
O advogado do ex-capitão, Paulo Catta Preta, no entanto, afirmou que seu cliente temia ser assassinado. Por isso não se entregaria às autoridades. O presidente Jair Bolsonaro, pai de Flávio, disse que Nóbrega foi morto “pela Polícia Militar da Bahia do PT”. O governador baiano, o petista Rui Costa, repudiou as declarações. Ele defendeu a ação da PM e acusou a Presidência de ter “laços de amizade” com “marginais”.
O corpo foi levado para o Rio na terça-feira, 11, à noite, em um voo comercial. A mãe do ex-capitão pretendia cremá-lo já na manhã de quarta-feira, 12, no Memorial do Carmo, no Caju. Mas foi impedida pela Justiça.
Na madrugada de quarta-feira, a juíza Maria Izabel Pena Pieranti, do Plantão Judiciário, atendendo a pedido do Ministério Público, considerou que o pleito da família não atendia aos requisitos da lei. Não estava, segundo a magistrada, acompanhado de documentos imprescindíveis, como a guia de remoção do cadáver e o registro de ocorrência. Além disso, alegou, a morte não se deu por causas naturais: “acaso fosse deferida a cremação, (…) inviabilizadas estariam eventuais providências a serem levadas a efeito pela autoridade policial”.
Na tarde de quarta-feira, o juiz Gustavo Gomes Kalil, da 4ª Vara Criminal do Rio, proferiu uma nova decisão contra a cremação. Desta vez, a medida ocorreu no processo referente à Operação Intocáveis, do Ministério Público do Rio. A ação apura a participação de Nóbrega no Escritório do Crime. A quadrilha é apontada como autora de extorsões, atos de grilagem e assassinatos por encomenda.
Na quinta-feira, 13, pela manhã, a viúva do ex-capitão, Julia Emília Mello Lotufo, pediu a realização de uma perícia particular no corpo. Ela também acredita que o marido pode ter sido executado. Não quer enterrar o corpo sem esclarecer essa suspeita. A Justiça do Rio negou o pedido. Foi feito então novo pedido de autorização para realização de nova perícia, agora à Justiça da Bahia.
Enquanto a Justiça não se decidia sobre a cremação e o novo exame, o corpo de Nobrega ficou em uma funerária em São João do Meriti, na Baixada Fluminense. Lá, teria sido embalsamado a pedido da família.
Uma nova decisão judicial determinou que o cadáver deveria ser levado para o Instituto Médico-Legal. Desde a noite do último domingo, o corpo “está acautelado em geladeira”, nas palavras de nota da Polícia Civil do Rio. O destino do cadáver segue nas mãos da Justiça.
Por Roberta Jansen
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