Desde o ano passado, o brasileiro vem convivendo com uma expressão até agora pouco comum por aqui: juros baixos. Foram cinco reduções consecutivas na taxa básica de juros da economia, a Selic, que a deixaram no patamar até há pouco inimaginável de 4,25% ao ano. É o nível mais baixo para a taxa desde sua criação, em 1996, quando o Banco Central instaurou o atual regime de metas para a inflação.
Esse movimento cria condições para uma nova dinâmica da economia brasileira. Muda, por exemplo, o cenário para as empresas, que podem renegociar suas dívidas e pegar financiamentos a custos mais baratos. Os consumidores também passam a ter acesso a crédito mais barato para comprar imóveis ou automóveis.
Mas o que vem provocando um nó na cabeça dos brasileiros – pelo menos daqueles que têm algum dinheiro sobrando no fim do mês – é o que fazer com seus investimentos. A taxa Selic é o indexador dos principais produtos de renda fixa, como são chamadas as aplicações conservadoras, destino de R$ 8,5 em cada R$ 10 poupados no Brasil. E sua queda foi enxugando os rendimentos pagos por produtos como CDB, títulos do Tesouro Direto, fundos DI e, claro, a caderneta de poupança. Levada a 4,25% ao ano, a Selic colocou um ponto final nos dias de ganhos fáceis do investidor.
“Ficou mais complexo investir”, diz Luiz Severiano Ribeiro, que lidera a área global de private bank do Itaú Unibanco. “A verdade é que o rentismo no Brasil acabou”, afirma Dan Kawa, chefe de investimentos da TAG. “Os juros caíram a tal ponto que tanto faz se 4%, 4,5% ou 6% ao ano. A maré virou e, mesmo que os juros subam ou caiam um pouco, a estratégia não muda muito.”
Por conta desse novo cenário, bancos e corretoras vêm mudando suas orientações para os investidores. A reportagem procurou diversas instituições para saber como estão as recomendações nesse novo cenário, levando-se com conta perfis de investidores conservadores, moderados e agressivos.
De todos os consultados, como se vê, apenas a corretora Necton, do economista André Perfeito, mantém uma recomendação, para conservadores, apenas em renda fixa. Hoje, 100% das alocações da Necton para o perfil menos afeito ao risco vão para títulos do Tesouro Direto pós-fixados, com rentabilidade vinculada à variação do IPCA, o índice oficial de inflação, acrescida dos juros definidos no momento da compra. “Basicamente, não acredito que (o Banco Central) vá derrubar mais os juros agora. Se a economia voltar a crescer e ganhar alguma força, será o sinal para a curva (de juros e inflação) subir”, diz André Perfeito. A declaração do economista foi dada dois dias antes do Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom) anunciar mais um corte nos juros.
Mas essa é a única exceção. Todos os demais gestores recomendam que o investidor diversifique os produtos que integram seu portfólio. “Tem de ampliar a exposição aos demais produtos do mercado, para além da renda fixa. A Bolsa é a nossa grande recomendação. Achamos que, no médio e longo prazos, os múltiplos vão compensar o investimento”, afirma Augusto Miranda, diretor de Private Banking do Bradesco.
Multimercados e ações lideram
Hoje, os gestores estão, gradativamente, ampliando a presença dos portfólios de seus clientes de produtos em fundos multimercado e ações. Os multimercados são fundos ativos, ou seja, constantemente balanceados por profissionais, que alocam o dinheiro dos investidores em uma cesta de produtos que vai da renda fixa à renda variável, passando por outros ativos, como câmbio, por exemplo.
No ano passado, dados da associação das empresas do mercado financeiro, a Anbima, colocaram os fundos multimercado na segunda posição na preferência do investidor, com R$ 66,8 bilhões em aportes, atrás apenas dos fundos de ações, que investem apenas em ativos de empresas negociados na Bolsa, que registrou R$ 86,2 bilhões em aplicações.
De todas as instituições consultadas, o Safra e o banco francês BNP Paribas são os mais animados com a renda variável em suas recomendações. Safra coloca 8% de ações e 33% de multimercados no portfólio dos investidores conservadores, enquanto o BNP sugere 10% em ações e 20% de multimercado para o mesmo perfil de aplicador.
Para Luis Azevedo, superintendente de análise da Safra Corretora, o Ibovespa, cesta com as principais ações da Bolsa de Valores, pode repetir em 2020 o desempenho do ano passado, quando subiu mais de 30%. “Temos uma visão bastante otimista para a Bolsa neste ano. Tanto que nosso time de análise acabou de elevar as projeções para o Ibovespa, passando de 130 mil pontos para 140 mil pontos”, diz.
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