Ao menos cinco construtoras residenciais estão com ofertas iniciais de ações engatilhadas para este ano, que devem somar cerca de R$ 5 bilhões. As ofertas subsequentes do setor (quando uma empresa que já tem capital aberto faz novas emissões) também fizeram fila no ano passado e devem seguir aquecidas em 2020. As companhias buscam musculatura para prepararem seus lançamentos.
De acordo com um levantamento feito pela Economática a pedido do jornal O Estado de S. Paulo, o setor de construção foi o que teve maior retorno (105,8%) em 2019 na Bolsa. Os papéis superaram em rendimentos os subsetores definidos pela Anbima como petróleo e gás (66%), energia elétrica (51%), comércio (40,5%) e intermediários financeiros (20%). Os especialistas alertam, porém, que muitas das ações de construção podem já ter atingido seu preço de equilíbrio.
Em 2019, os números do setor foram notáveis. Com 81.218 unidades lançadas até outubro, o volume de novos imóveis foi 6,8% superior ao registrado no mesmo período de 2018. Além disso, as vendas de novas unidades cresceram 9,8% em comparação com o ano anterior, segundo dados da Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc). De acordo com o Departamento de Economia e Estatística do Secovi-SP, só em outubro foi registrada a venda de 3.467 unidades residenciais novas, resultado 23,2% maior que as vendas de outubro de 2018 no Estado de São Paulo.
Em ano de retomada, as empresas de construção já listadas na Bolsa captaram um total de R$ 5,5 bilhões por meio de oferta subsequente de ações. Foram os casos de Tecnisa, Trisul, Eztec, Helbor e Gafisa, entre outras, que usaram esse dinheiro para pagar dívidas e aplicar em novos empreendimentos. Em 2018, o retorno das ações de construção foi de apenas 4,53%. E, em anos anteriores, como 2014 e 2015, os papéis chegaram a se desvalorizar 34%.
Isso indica que a alta de mais de 105% de 2019 também pode ser explicada pelo patamar de preço relativamente baixo em que o setor se encontrava. O levantamento da Economática, que comparou a valorização dos setores da Bolsa, considerou papéis com volume médio diário superior a R$ 1 milhão por dia em 2019 e presença nos pregões acima de 90% com quatro ou mais representantes.
Na onda positiva para o mercado imobiliário – puxada principalmente pelos juros mais baixos que facilitam financiamentos -, as construtoras Moura Dubeux e Mitre já pediram registro para realizarem oferta de ações na Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Outras três – Kallas, Cury e You,Inc – estão com sindicatos de bancos contratados para coordenar os processos esperados para o segundo semestre. A última vez que uma construtora estreou na Bolsa foi em 2009, quando a Direcional abriu capital.
Perspectiva
O coordenador do laboratório de finanças do Insper, Michel Viriato, diz que, apesar do cenário otimista, não se deve esperar uma valorização histórica dos ativos em 2020. “Não vamos ver, provavelmente, uma explosão como houve em 2013. Estamos em outro momento de crescimento econômico.” Ele comenta ainda que, com os retornos observados no último ano, há empresas que já atingiram seu potencial. “Não estou dizendo que já passou a hora de investir nesse setor, mas muita coisa já atingiu seu preço. É preciso tomar muito cuidado com setores badalados, porque eles podem já estar refletindo as expectativas”, diz.
“Os novos IPOs acontecem agora porque antes disso ninguém estava interessado em comprar papéis de construção. O mercado estava muito ruim”, explica o professor de finanças da FEA-USP Keyler Rocha. Em sua visão, em tempos de juros baixos há espaço para a continuidade do crescimento do setor, já que ele é dependente de financiamentos. Ele pondera, porém, que ganhos passados não garantem lucros futuros.
O número de estreantes na Bolsa pode ainda engrossar. Outras construtoras, além das citadas, cogitam tomar o mesmo caminho. Companhias de outras regiões, para além do Sul e Sudeste, também estudam se capitalizar via oferta de ações, tal como a pernambucana Moura Dubeux. “Temos a possibilidade neste ano de mais follow on e algumas ofertas iniciais”, diz o sócio da área de mercado de capitais do escritório Mattos Filho, Jean Marcel Arakawa. Segundo ele, empresas do setor sinalizaram intenção de ir a mercado.
Nessas estreias, o investidor pode se perder. Viriato, do Insper, afirma que escolher entre os IPOs e as empresas que já têm capital aberto não é tarefa fácil nem mesmo para especialistas. “Para quem está começando no mercado é sempre melhor acessar esses ativos por meio de fundos”, diz.
Outra questão a ser considerada pelo investidor é que o capital arrecadado pode causar corrida por terrenos e aumento rápido nos preços, comprometendo a rentabilidade das construtoras e frustrando os acionistas. “O superaquecimento começa a ser uma preocupação. As empresas se capitalizaram e saíram comprando terrenos”, afirmou Gustavo Cambaúva, analista de construção do BTG Pactual. “Isso ainda é uma situação muito concentrada nos bairros nobres de São Paulo, mas é natural imaginar que vai chegar aos outros bairros em breve.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
Por Circe Bonatelli, Fernanda Guimarães e Talita Nascimento
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