A Gerdau não é mais a mesma. Aos 119 anos e representante tradicional da “velha indústria”, a siderúrgica derrubou paredes, eliminou salas e níveis hierárquicos. Nos últimos quatro anos, 40% dos cargos de média gerência foram eliminados. Agora, a empresa pretende faturar com a transformação: abriu uma área de Novos Negócios e pretende fazer com que 20% da receita anual venha de áreas nas quais ainda não atua, em um prazo de dez anos. Com receita anual de R$ 50 bilhões em 2018, significaria ter R$ 10 bilhões vindos sobretudo da prestação de serviços ligados ao aço.
“Em vez de vender só o aço, venderemos o serviço também. Vamos ganhar participação de mercado, venderemos mais aço e ficaremos menos dependente das oscilações da commodity”, diz Gustavo Werneck, presidente da empresa. Há dois anos no cargo, Werneck é o primeiro comandante do grupo vindo de fora da família fundadora Gerdau Johannpeter.
Abaixo, os principais trechos da entrevista:
Qual o maior desafio no processo de transformação da Gerdau?
Foi mudar o “mindset” das pessoas. Não é uma questão de idade. As pessoas estão acostumadas a terem alguém acima delas para tomar a decisão, não querem risco, têm medo de autonomia e de errar. É mudar essa mentalidade: se não deu certo, começa de novo. Mas avançamos muito. Tivemos de trocar muitos líderes que não foram capazes de se adequar a essa nova realidade. Fizemos muitos treinamentos e estimulamos a mudança, mas muitos não se adaptaram. Chegamos a trocar 40% da média gerência em quatro anos.
As primeiras mudanças trouxeram impactos do ponto de vista financeiro?
Muitos. Um dos mensuráveis, e que é um importante indicador para nós, é a “despesa com vendas gerais e administrativas”, algo que o mercado chama de colesterol ruim. Se a estrutura é muito lenta e pesada, ela usa grande parte da receita para se manter. Há quatro anos, a gente operava com 8% da receita líquida para pagar essa estrutura de venda gerais e administrativas. Hoje passamos a operar em 3,5%: reduzimos R$ 1 bilhão em custos.
Depois da fase de redução de custos, agora o objetivo é expandir receitas com produtos e atendimento customizado?
É mais do que geração de receita: é geração de valor, tanto para nós quanto para nossos clientes. Um produto importante para nós, por exemplo, são os grandes perfis estruturais, para fazer o estaqueamento de obras. Nosso modelo de negócio anterior era vender o aço para a construtora, que contratava uma empresa para cravar a estaca e outra para medir se a estaca estava com resistência adequada para suportar o prédio. Para gerar valor ao nosso cliente, reduzindo o prazo da obra e evitar que a construtora tenha de lidar com diversos fornecedores, iniciamos uma empresa de fundações metálicas. Em vez de vender o aço, vendemos a fundação pronta. Com a retomada da construção e da infraestrutura, o cliente da Gerdau vai contratar a fundação pronta. Em vez de vender só o aço, venderemos o serviço também. Vamos ganhar participação de mercado, venderemos mais aço e ficaremos menos dependente das oscilações da commodity.
A Gerdau tem outras empresas de prestação de serviços?
Criamos, por exemplo, a empresa “Juntos Somos Mais”, em sociedade com a Votorantim Cimentos e a Tigre. Nesse primeiro momento é um programa de fidelização de lojas de material de construção e profissionais. O próximo passo é criar uma solução para reformas. (Terá espaço para crescer porque) a experiência de reforma é muito ruim no Brasil. Outra empresa que criamos foi a G2L, de logística. Temos um gasto alto com logística e muita ineficiência e fizemos uma empresa logística digital, uma plataforma, com logaritmos e inteligência artificial que nos dá as melhores opções de frete. Com essa empresa conseguimos reduzir todo o impacto com o tabelamento do frete, que foi superior a R$ 200 milhões em 2019. Entre as empresas constituídas oficialmente e as que estão em fase piloto já são oito no guarda-chuva da Gerdau.
A Gerdau vai avançar com esta estratégia?
Como temos várias iniciativas nesse sentido, não estamos conseguindo dar a elas a velocidade que gostaríamos. Criamos então uma nova divisão de negócios, de “Novos Negócios”, com esse objetivo. A última reunião do Conselho (de Administração) decidiu que parte importante do faturamento da Gerdau, de 20% do faturamento nos próximos dez anos, virá de negócios que a gente ainda não tem. Um dia alguém vai chegar e eliminar as ineficiências do setor industrial. Queremos ser o ator importante na eliminação dessas ineficiências. Paramos, então, de olhar só o mundo do aço.
Essas iniciativas atingem também o braço que vende ao setor automotivo?
O segmento de aços especiais – usados pelos fabricantes de carros – é muito importante para nós. Com o processo de eletrificação dos veículos, veremos mais lançamentos de híbridos e elétricos, que precisam ser mais leves. Resolvemos entrar no segmento do grafeno (derivado do grafite, material extremamente forte e leve) porque esse material e o aço vão coexistir em escala maior na produção de carros. É novo para nós lidar com patentes e desenvolvimento de aplicações. Abrimos um escritório em Manchester, onde fica o maior centro ocidental de desenvolvimento do grafeno. Quando o grafeno crescer nessa indústria, seremos um competidor relevante. Estamos agora desenvolvendo uma solução para o vergalhão, no qual poderá ser feita uma pintura de grafeno, para que ele possa sobreviver, por exemplo, a ambientes corrosivos. Fizemos uma associação com a Universidade de Manchester e agora estamos decidindo em que lugar abriremos fisicamente a empresa.
Quais suas expectativas para a economia brasileira em 2020?
Estamos muito otimistas com o Brasil, como não estivemos nos últimos anos. Não só diante das reformas e dos sinais da economia, mas vendo a tradução disso em entrada de pedidos. Os últimos meses foram muito bons na construção civil.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
Por Fernanda Guimarães e Cristiane Barbieri
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